quinta-feira, 25 de janeiro de 2007

«Isto, partindo, será fácil de inteirar. Basta-me, a mim, espirrar os cacos do espelho, que sem querer mastiguei com os olhos, e recortar...

...do infinito as variáveis que ajudam a delimitar a coisa. Feito isto, está feito. Isto.»

Dedilhando cada osso, num contorcionismo atroz.
Resta a aparência certa de cada um de nós. A casca inquebrável geme soslaios vislumbrados a cada aresta. Insinuações sinuosas, insonsas, intragáveis, remontam aos ventos vindos. Onde foi que a razão se prendeu? Para onde fugiram os olhos? E os cheiros? E…

Em assomos brilhantes, resvalam para a desgraça todas sensações absurdas. Surdas.
Gestos entranhados, lestos e tentados.
Desfaz-se amor com abraços. Laços.
Fecundam-se leitos. Desfeitos.
Desmembram-se afectos. Fetos. Parem-se insultos que condensam ao esbarrar no gelo da indiferença ausente. Precipitam os favos da cumplicidade sublime na degustação alternativa daquilo que, em tempos, enfartava. Anorexias tão recorrentes como o enclausuramento etéreo. Está torcido o corpo.

Adormecer o esquecimento em meandros defeituosamente esquiçados, rasurados, docemente trespassados…brancos. Brancos, são os corvos alvos em matilhas sedentas de tempo e de olhares cativantes. Esburacam órbitas ciclópicas na tentação da dor. Repastam na idade. Repostam na fuga. Rapam os indícios. Voam…sorrindo em grasnos quedantes e vertiginosamente dispersos. Detríticos. Dendítricos. Dispensáveis. Regenerantes. Revitalizantes da alegria inocente. Memórias adquiridas num futuro quase ausente, mas emergente. De novo os voos rasantes…alados no sorriso. São jovens enrugados já perdidos na decomposição putrefacta do que ainda não alcançaram. Impacientes pelo desespero alheado. Rígidos. Enormes na sua contemplação incompletamente submersa. Aviltada. Inversa. Deitam-se os avessos. Morrem travessos. Atravessados. Simplesmente arremessados.

Mas qual revolta? Revolvo a postura que se disfarça no ser. Embalo a competição desgarrada na forma. Até na ira. Mágoa opticamente inadvertida. Dorme silêncio cutâneo. Carrega o sonho nas costas escorregadias. Agita-te nas palavras. Mói as presenças enfermas. Deixa-te ir na mistura de cada cor efémera. Dorme…

(em paz)

12 comentários:

isabel mendes ferreira disse...

.....gostaria de ter escrito....


____________________


sublime assim.




_________________obrigada pela visita ao Piano...o outro lado de mim.

Rafeiro Perfumado disse...

Tirando a cena dos corvos brancos, até está aqui um pedaço de prosa engraçado... e agora vou-me, em paz.

Teardrops disse...

E como poderia dormir depois de tão revoltas palavras me trespassarem a alma e de fogo a marcarem...

Como poderei ter paz se me gritas aos ouvidos:
"Gestos entranhados, lestos e tentados.
Desfaz-se amor com abraços. Laços.
Fecundam-se leitos. Desfeitos.
Desmembram-se afectos."

lifeyes disse...

Gostei mesmo :)

Burrita disse...

Continuo gelada!
Em dias que se sentem, estranhamente frios e nublados pergunto:
haverá Outro?
terá Outro luz dentro de si?
poderá Outro aquecer dias gélidos e sombrios?
como será Outro postado doce e quente?
Fica Bem!

Anónimo disse...

Ainda gelada de espanto pelo comentario anterior digo : "Eu voto Nao!"...

Ah...e os corvos nao sao brancos...sao azuis ;)

Burrita disse...

Cat, agora perdi-me no seu voto??
Estou gelada e diz-me que não há salvação possível, pois vota não??
..peço desculpa pela ausadia!

damularussa disse...

Na falta de originalidade (minha), lá sorrio e muito. Sinal que gostei, e muito .. até pensei..
"Finalmente a exposição de um OUTRO texto , evitando assim o defraldar...ups perdão..defraudar de alguns expectantes."

Um abraço

Fallen Angel disse...

Amigo, companheiro... dispensemos a ironia que não é para aqui chamada. Brincas com as palavras de forma tão soberba que, até na enleio em que as colocas, ficamos nós enleados... de enlevo.

Grande abraço.

Bigmac disse...

Tu dizes "OUTRO" e orgulhas-te dessa palavra. Porém, maior - coisa que tu não queres crer - é o teu corpo e a tua razão grande. Ele não diz OUTRO, mas: procede como OUTRO.
Porém delineia-se aqui, mormente esplendorosa, a imagem da sua mais alta esperança, do seu fim mais determinado.

Lyra disse...

Pura poesia...
Adoro a intensidade que irradias em cada frase.
Faltam-me as palavras, perante quem tem o dom de "brincar" com elas desta maneira.
Bjos*

Inha disse...

Eu vim só dizer que li. Tenho lido. Ainda estou off-line.


Amei


*